A partir de hoje passarei a escrever bimestralmente neste espaço. Gostaria de agradecer a oportunidade e destacar que a troca de experiências é uma das principais fontes de inspiração e obtenção de conhecimento. O encontro com boas ideias e _cases_ de sucesso pode ajudar a mover projetos e impulsionar carreiras.
Aqui no “Vida de Startup”, vou escrever não apenas sobre o mundo de startups, mas, principalmente, sobre o que isso impacta o dia a dia de executivos e de grandes corporações. Afinal, empreender deixou de ser sinônimo de começar uma empresa e passou a ser **uma postura de todo profissional em sua própria carreira.**
As próprias corporações têm atuado fortemente em venture capital, os famosos CVC (Corporate Venture Capital). Entre as _Fortune 500_, mais da metade já possui iniciativas de CVC. A “transformação digital” se tornou termo imperativo em qualquer plano estratégico, crucial para a tal sobrevivência. E corporações têm se tornado aquisitivas. Recentemente, uma startup investida por mim foi adquirida pelo [Itaú Unibanco.](https://link.estadao.com.br/noticias/inovacao,itau-compra-a-zup-startup-de-uberlandia-por-r-575-milhoes,70003072004)
Não é apenas na diretoria que o digital se infiltrou. Está nos corredores, no boteco e no DP. A cultura de startup tem invadido o ambiente corporativo, com seu dicionário de anglicismos: _scrum_, _squad_, _agile_… _stock option_, _cliff_.
Neste ambiente de transformação, em ritmo de Fórmula 1, vamos usar este espaço para discutir diferentes assuntos, como por exemplo:
* Uma companhia consegue se digitalizar e se reinventar?
* Quais as grandes armadilhas que impedem isso de acontecer?
* Conselho de startup é diferente de conselho de grande empresa?
* Por que o conselho certo na hora errada pode ser fatal?
* É hora de se arriscar e tentar a vida numa startup? Ou será que é hora de empreender? Quais os _trade-offs_?
* Como realmente funciona uma startup?
* E os _valuations_ de startups?
* O que é e como funciona um venture capital?
Para começar esta conversa, iniciemos pelo final: venture capital tem várias traduções. Investimento em capital de risco (odeio essa), investimento em startups, entre outras. Eu gosto de definir venture capital como: **a arte de investir em grandes negócios enquanto elas ainda são muito pequenas.**
Arte, pois é realmente um trabalho de artesão. **Venture capital é pouco escalável.** Nossos fundos de _early stage_ têm cerca de US$ 150 a 200 milhões de patrimônio para cada safra, investem em cerca de 30 corporações cada, e não devem crescer com o tempo. Isso acontece porque se levantarmos o dobro de capital, teríamos que investir no dobro de companhias. E no nosso negócio, a teoria dos retornos marginais decrescentes é lei. E assim, ao invés de escolher as 30 melhores da safra, escolheríamos as 60 melhores, abaixando a barra do processo de seleção. Conversamos com mais de 2 mil empresas por ano, para investir em menos de 10. **Passar neste funil, de 200 para um, é mais difícil que entrar em Medicina na USP** (onde em 2018 concorreram 115,2 candidatos por vaga).
Mas nem toda pequena empresa é uma empresa pequena. Vestígios de alguns ingredientes precisam ser identificados para que ela possa vir a crescer muito e, mais importante, crescer rápido. O ciclo costuma ser de 7 a 10 anos entre investir e desinvestir. Pode ser muito para um ansioso investidor e pode ser pouco para um apaixonado empreendedor. Na arte, o nosso fundo é um dos primeiros a entrar na firma e saímos com os fundadores, seja numa venda ou numa oferta pública de ações. A gente sempre espera que a vida siga a arte.
Primeira observação: **Venture capital não se trata de investimento em tecnologia. Trata-se de um investimento em empresas de altíssimo crescimento.** Acontece que não se sabe outra forma da startup crescer tão rapidamente sem o uso intensivo de tecnologia. Seja em seus processos, seja em seu produto.
Tamanho de mercado é um ingrediente fundamental, além de um importante teste ácido. Se ele não for grande o suficiente para comportar esta companhia valendo alguns bilhões, a oportunidade é infelizmente um “_pass”_. Isso não quer dizer que organizações incríveis e extremamente lucrativas não possam ser criadas em mercados menores. Também não quer dizer que a empresa não possa expandir e abocanhar mais mercados, tornando-se bilionária. Mas, para o tipo de retorno que os melhores fundos de venture capital precisam entregar a seus investidores (na casa do 25% ao ano), não ter uma clara visão de que o mercado é grande o suficiente, é um risco adicional que não se precisa correr.
Depois, é necessário entender qual a dor que está sendo resolvida. Quanto maior a dor, maior a chance de sucesso da corporação encontrar um modelo de negócio rentável e duradouro. Aqui procuram-se aspirinas, e não vitaminas. Vitaminas são chamadas também de _“nice to have”_, perdem prioridade na agenda do cliente, tem conversão em vendas mais baixa e costumam demorar mais para escalar vendas.
Por último e, como era de se esperar, o mais importante: vem o time. As pessoas. Venture capital é investir em pessoas, em capital humano, e não em fluxo de caixa ou modelo de negócio. Investimos num time A com um produto B, nunca no inverso, até porque vai ser difícil o produto decidir mudar o time. Quando investimos em companhias como Gympass, Creditas e Olist, seus modelos de negócio eram diferentes do que as tornaram bem-sucedidas. Seus times eram um punhadinho de pessoas além dos fundadores.
Times vencedores vão mudar o modelo de negócio, descobrir novos mercados, entender a real dor do seu cliente e, principalmente, liderar e atrair gente talentosa. O maior ativo de uma empresa, seu real patrimônio e seu diferencial competitivo de longo prazo estão na **ca****pacidade intelectual do seu time e na competência da cultura,** que rege esse grupo de talentos, em gerar cooperação e extrair o melhor destas mentes.